quarta-feira, abril 5

O tempo

Certo dia vi um disco num escaparate. Era bonito e custava 2 euros numa qualquer promoção da Fnac. Era um livro de capa dura com uma compilação de "canções de natal" electrónicas.
Como conhecia 2 ou 3 nomes achei que não era uma má compra. Chegado a casa carreguei no play e comecei a ler a história que lá vinha dentro. Uma história do famoso escritor Paul Auster e que tinha sido publicada em 1990 no dia de Natal no jornal The New York Times. Uma treta - pensei antes de começar a ler. Acontece que o Paul Auster conta uma história de introdução à própria história que achei extraordinária e por isso acabei por fazer um último post um pouco enigmático, mas que não quero deixar de explicar.
Esta história é sobre um homem que o Paul Auster conhecia na altura há mais ou menos 11 anos. Vendia-lhe cigarros e revistas numa banca de jornais em Brooklyn. Um dia enquanto folheava uma revista no seu local de trabalho, encontra uma foto do escritor e reconhece-o. A partir desse dia deixa de o considerar um cliente habitual para o considerar uma "pessoa distinta". Para este homem a maior parte das pessoas não se importavam com livros nem com escritores mas ele que se considerava também um artista passou a considerar o seu cliente um confidente. Um dia pede-lhe se estaria disposto a ver as suas fotografias. Então, de dentro de uma caixa tira 12 albúns de fotografia todos iguais. Era o trabalho da sua vida e só despendia 5 minutos do seu dia a fazê-lo. Todos os dias às 7h00 da manhã, na mesma esquina e do mesmo sítio, durante os últimos 12 anos, tirava uma fotografia a cores. Já tinha ultrapassado as 4.000 nessa altura. Tinha um álbum para cada ano, onde todas as fotografias eram dispostas por ordem e com a data respectiva, de 1 de Janeiro até 31 de Dezembro.
O escritor ficou sem saber o que dizer, ao ver a mesma rua e os mesmos prédios repetidos vezes sem conta e começou a passar as páginas cada vez mais rápido num gesto que qualquer pessoa normal faria se se encontrasse numa situação embaraçosa como aquela.
Até que o homem lhe disse: "Estás a ir rápido demais, se não abrandares nunca vais perceber." Mudanças no tempo. Mudanças nos ângulos da luz com o avançar das estações. Mudanças no trânsito. Dias de semana. Fins de semana. As suas diferenças. E a pouco e pouco, as caras de pessoas que eram iguais todos os dias. Depois de as reconhecer, começou a reparar nas posturas, nas expressões e na forma como essas pessoas viviam de dia para dia.
Foi nessa altura que o homem começou a recitar um poema do Shakespeare e o escritor percebeu tudo.

3 Comentários:

At 13:57, Blogger O Meu Outro Eu Está a Dançar escreveu...

Que história tão bonita! Gostava de ler mais livros do Paul Auster, só li o Timbuktu, a história sobre a vida de um cão. E gostei muito!

 
At 22:33, Blogger Alexandr3 escreveu...

Continuas a ser tu quem traz este blog para cima!

 
At 09:35, Anonymous Anónimo escreveu...

I love your website. It has a lot of great pictures and is very informative.
»

 

Enviar um comentário

<< Home